terça-feira, 8 de julho de 2014

O Grande Assalto e ...




Neste fim de semana assisti a dois filmes que não entraram no circuito comercial. São eles, “O Grande Assalto 11.6”, 2014, com François Cluzet, e “Na trilha do Assassino”, 2009, com Russel Crowe. Neste último, dois atores jovens, John Foster e Sophie Traub roubam a cena.
  
 Ambos os filmes, em sua gramática, traem aspectos que se relacionam ao formato, o gênero e a sua classificação como filmes de ação e tensão psicológica, mediante a desconstrução de alguns signos deste tipo de linguagem - por exemplo, foram suprimidos os clichês que delimitam este formato, assim como o andamento mais lento das cenas e o foco na concepção mais densa e ambivalente dos personagens.

Em "O Grande Assalto 11.6", um motorista de caminhão de transporte de valores rouba a carga que transportava no valor de onze milhões de euros - valor aqui tão significativo quanto a dimensão da sua ação, contraditória e impactante; ou quanto à sua motivação subversora em contraponto ao objeto em questão, símbolo de status e poder. Subversão e Ordem refletem a significação que se alterna de forma orgânica durante toda a narrativa, composta de momentos fragmentários com sequências que vão se adensando com o isolamento do personagem.

Uma narrativa aparentemente lenta em seu andamento, esconde uma inconformidade latente que  vai se saturando, como uma bomba prestes a explodir.

Um tratamento interessante do tema, que aborda com propriedade o lugar do indivíduo na sociedade. E o peso desta sobre ele, se utilizando de um recurso documental sobre como as pessoas vêem não só a ele como a si mesmas, quando indagadas sobre seu comportamento - como se fosse um make off.

Ao final, o protagonista é capturado na tela, como um flagrante de sua condição, dando voltas concentricas em um pequeno espaço. O pequeno espaço social que lhe fora antes reservado, foi transmutado agora em um pequeno espaço físico.

"Na Trilha do Assassino" reflete a transfiguração do sistema em um detetive - com requintes de um estoicismo puritano, cuidando de sua esposa em estado vegetativo. Acrescente a isto, um casal de jovens psicopatas.

Um quadro em que ninguém deste triunvirato é normal ... ou, o que é normal ?  O texto parece tratar da entropia no limite do que é classificado pelos órgãos de controle, como dentro e fora do padrão; da margem de indução que permeia tal noção, como forma de exercer a autoridade e de impor a disciplina em uma sociedade com a característica volátil de uma sociedade como a norte-americana.

Temos portanto, laivos de um reacionarismo de direita, tão radicalmente liberal, que ao indivíduo (detetive) cabe o papel do estado, ministrando doses de justiça conforme sua vontade. Há aqui mais uma vez o conflito entre Subversão e Ordem, agora no entanto interiorizado dentro do sistema.

A viagem dos personagens é cheia de meandros, que se compõem de lugares, armadilhas e desejos em conflito. O desenlace final da história tem a intensidade dramática das grandes tragédias gregas, e como estas fundado em um pathos que determina o destino de todos os envolvidos.



Por A.H.Garcia

2 comentários:

Anônimo disse...

Bom ter um local onde se pode ler um bom texto sobre filmes.
Parabéns! :)

Semicinema disse...

O importante do seu comentário, é saber que a mensagem está alcançando
alguém ... e que a linguagem empregada é compreendida e reconhecida. Obrigado, por compartilhar essa pretensão estética.
As imagens, textos e sons que compõem um filme, são signos que se articulam esteticamente, para comunicar; produzindo sentimentos e subjetividades em torno de um tema, como uma obra de arte.
Valeu anônimo!