sexta-feira, 20 de junho de 2014

The Walker ( O Acompanhante )

Gostei do título em inglês tanto quanto o título em português. Há um mesmo significante nos dois, uma característica linguística muito peculiar em se tratando dos termos que são arranjados para suas denominações.

Estou até o momento ouvindo a música de fundo dos créditos finais, uma mistura interessante de música incidental com uma interpretação feminina, um tanto andrógina, temática e percursiva - muito apropriada aliás ao seu fim ...

Já havia observado nas barras de programação, o título, que me chamara a atenção. Então abri mais o set-up, e vi os nomes de dois atores instigantes - por motivos variados  e aleatórios -, Woody Harrelson e Kristin Scott Thomas ... achei a dupla inusitada.

Me propus a ver o filme, e dei de cara com um grande ícone de cultura cinematográfica americana, Lauren Bacall. Ainda em plena forma, dando uma dimensão bastante simbólica ao argumento do filme: um complexo de elementos genealógicos, puritanos, políticos e finalmente psicológicos, que sobretudo são profundamente simbióticos, em se tratando do jogo e das relações de poder de uma casta invisível sob a pele de sociedade democrática.

"O acompanhante" é história de uma pária para a sua própria casta social - nunca pensei sobre este aspecto em uma sociedade de massa, como a americana -, das famílias tradicionais de Washington D.C.. Mero acompanhante de senhoras casadas com figuras proeminentes da política e do poder, por um desvio psicológico ligado à sua relação com o pai -, que provavelmente determinou também sua homossexualidade, um tanto indefinida -, um grande político herdeiro de uma tradição familiar no poder, a qual parecia ter se encerrado com ele, Carter Paige III.

Um assassinato, pathos recorrente em uma boa trama, e a original sacada das contradições morais e do jogo de aparências do poder, tratados com uma leveza surpreendente, traduziram-se em uma interessante narrativa calcada em episódios carregados a um tempo de gravidade e cinismo, e de aspectos temporais, como por exemplo o comentário do personagem sobre a caça às bruxas após o 11 de setembro, que retratam um painel realista sobre aquele contexto.

Um final condizente com a moral da história, onde os ricos e poderosos são poupados do julgamento público e suas mulheres continuam sendo a consciência comprada com o status quo, reunindo-se em clubes exclusivos. O aspecto freudiano, ou como diria uma amiga - lacaniano - foi a percepção do "acompanhante" do fato de sua relação com pai ser determinante em seu comportamento subserviente, e da sua posição passiva socialmente -, recusando conscientemente aquele modo de vida.

Bom, certamente é um filme ácido demais para o circuito comercial, e inteligente também, o que não é qualidade recomendável na maioria dos casos.

Aconselho.  

A.H.Garcia

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