quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Baaria - a porta do tempo

Li uma "crítica" sobre "Baaria", na qual o autor sentenciava que o diretor Giuseppe Tornatore havia pretendido reeditar o sucesso de "Cinema Paradiso" - do próprio diretor -, mas, não havia conseguido tal intento.

"Baaria" como "Cinema Paradiso", são dois exemplos de como filmes com acabamento estético apurado podem ser acessíveis e ao mesmo tempo densos, pelo lirismo que consegue transgredir e subverter a realidade imediata. Afinal, para mim esta é a função do cinema - mesmo como obra de arte -, ser um transporte; melhor, um teletransporte.

Esta, a grande e feliz semelhança entre as duas obras. Uma outra, fundamental, a onipresente referência ao cinema e sua importância comunitária.

A temática de Baaria tem mote, contexto e viés completamente diversos. Nesse particular, o enfoque sobre a importância do PCI como ator político em uma região atrasada e pobre, dominada por organizações como a máfia ... e todas aquelas questões relativas à identidade do partido em uma região em processo de transformação das relações sociais.

A metáfora de pai e filho se cruzando atropeladamente, por uma rua que vai se transformando à medida que eles continuam a correr em direções opostas, esta encruzilhada do tempo, em que se debruça o filme de forma extremamente bela.

Em sua bagagem, a tradição do neo-realismo no tratamento da temática proposta. Com uma fotografia calcada em matizes fortes, que realçam paisagem rústica e acidentada e, ao mesmo tempo, os conflitos latentes sob um panorama quase selvagem ... em que os homens têm sua existência praticamente suprimidas pela ignorância e pela bruteza que permeam suas vidas

Fiquei sobremaneira impressionado com Pepino, o personagem central e fio condutor da história. O existencialismo à italiana, que ele exala com sua ideologia de esquerda e uma consciência estóica, em contraponto com todas as mudanças que o mundo atravessa ... ressaem-se na cena final em que, contido, se despede do filho (presumo que o próprio Tornatore) e o manda fazer a vida - como seu pai, um campesino emancipado, havia feito com ele -, e logo após corre "tragicamente" contra o tempo.

Um filme de verdade ... vi outros dois filmes depois, "Homens em Fúria", com Edward Norton, De Niro e Milla Jovovich -, que sex appeal! -, e "Instinto de Vingança", baseado no Conto "Coração Delator", de Edgard Allan Poe, que foram decepcionantes.

Por A.H.Garcia