terça-feira, 24 de março de 2009

DÚVIDA

“ Dúvida ”. Substantivo feminino que designa incerteza sobre verdades estabelecidas, ou posição que se deve adotar frente a aspectos concretos que se baseiam em tais dogmas. Pelo menos, é o que se espera quando nesta dúvida estão envolvidos questionamentos morais e metafísicos.

Poderíamos dizer, que o argumento da obra reside nessa palavra e nesses aspectos, decorrentes das contradições que marcam a formação dos quadros da igreja católica em uma sociedade predominantemente puritana – e sua irrefreável pulsão sexual.

A caracterização do ambiente, propositadamente árido e ressequido pelo frio inverno, e o jardim, que, não por acaso, concentra a significação do filme – o local onde são travados senão os diálogos mais fortes, os mais reveladores; jardim do éden ou purgatório dos ímpios. Em todo caso, lugar cujo vazio é simbolizado pelo branco da neve e a opacidade da atmosfera, que caracterizam a fotografia e a luz do filme em suas seqüências externas, e expõe a densidade e o conflito dos personagens – que se revelam como chaves para entender como se fundem e clivam fatos políticos e morais, tendo como fio condutor o embate entre uma freira e um padre.

Neste embate, há uma conotação subjacente de emasculação da figura masculina e de histeria da feminina. Identificadas respectivamente, com o subjetivismo afetado que constituiria um atributo feminino, e a rigidez moral que deveria ser um atributo masculino –, a igreja uma estrutura eminentemente patriarcal e machista, desde suas origens. Essa inversão seria interpretada como uma distorção dos papéis que predominam secularmente na igreja católica.

Quando a dogmática freira admite pateticamente no desfecho do filme, que tem dúvidas. Estas não se refeririam às relações de poder e a ética da igreja ? E não seria esse o terreno propício para o aparecimento do fenômeno da pedofilia ali ?

Phillipe Seymour Hoffman e Meryl Streep protagonizam magistralmente essa parábola contemporânea. Uma parábola que tem por objeto a própria igreja e seus segredos.

sexta-feira, 6 de março de 2009

" FORÇA POLICIAL "

“ Força Policial ” é o título em português. Em inglês, “ Pride and Glory ”. Já ouvi alhures alguma comparação com “ Tropa de Elite ”, que não vi ainda.

É um filme que traduz a visão entrópica no tratamento das questões sociais, carregada de signos que sempre permearam a cultura, e, mais especificamente, o cinema americano desde John Ford, Howard Hawks etc, do invidualismo, e, por extensão, do herói solitário, este uma instituição americana inexorável até mesmo para um filme que tem a pretensão de retratar a vida dos descendentes de irlandeses que quase se confunde com a polícia de Nova York – NYPD.

Há algumas referências à cultura gaélica, entretanto bem superficiais, assim como a abordagem de sua influência nas relações familiares. Entretanto, de uma forma geral ressai a brutalidade característica dessa população urbana, cujo o único espaço que lhes coube foi aquele – temidos entre criminosos, subalternos para o resto da sociedade.

As mulheres têm o seu lugar recatado e passivo, em uma comunidade de policiais, irlandeses e de outras etnias, às quais também é reservada essa tarefa de limpadores da cidade.

A costura da trama resulta um texto correto, que convence. O mote do filme se expressa na patogenia de uma sociedade esquizóide, que é representada pelo paradoxo do policial Jimy Egan, protagonizado pelo excelente Colin Farrel, um ser sem qualquer controle sobre seus impulsos violentos, com requintes sádicos, capaz de, ao mesmo tempo, de amar esposa e filhos com uma veemência incondicional, ou pelo menos pensar dessa forma.

O triunvirato John Voight, Edward Norton e Colin Farrel dá a consistência dramática do filme,
que flerta com o espirito trágico.

A direção equilibra bem a tensão até o desfecho do filme, que resgata a atmosfera social optando por um final catártico e grandiloquente. A fotografia sempre privilegiando um tom outonal, e a atmosfera noir que o filme reboca, contribui no resultado final.

Por Antonio Henrique Garcia